sexta-feira, 30 de março de 2007

Perto do Fogo


Na madrugada desta quarta-feira foram incendiadas quatro portas de quartos da Casa do Estudante da UnB. Após relatados à Reitoria da universidade os problemas relativos à xenofobia e racismo anônimos ocorridos nos prédios residenciais dos estudantes nada ainda havia sido feito. Pichações com motivos racistas e xenófobos foram ostensivamente escritos em portas e paredes do dormitório. Apesar dos protestos dos alunos o silêncio sobre o assunto foi a política da universidade. Alunos africanos são convidados entre nós para participarem de programas de ensino, tanto na graduação como na pós, no entanto, a democracia racial defendida pela reitoria como parte da história da universidade, que sempre lutou pelos direitos sociais, não parece ser a verdade. A justificativa de que a universidade foi pioneira na discussão e implantação das cotas para negros também não parece redimi-la da culpa de, como em qualquer ambiente desse país, o racismo ser uma pauta pouco discutida e uma prática constante. Houve, todavia, uma oposição de discursos não levada em consideração e deixada em aberto, as opiniões contrárias à implantação das cotas eram, em grande medida, discursos do racismo às inversas, e reclamava-se energeticamente da existência de pólos raciais no Brasil, gerando antipatia contra aqueles que buscavam dar visibilidade ao fato social brasileiro da existência de racismo entre nós, e da necessidade de buscar soluções rápidas para a educação formal de grupos de cor nos quadros universitários, tendo em vista formas culturais e lugares de atuação distintos desses novos alunos, o que traria novos desafios intelectuais e de convivência para o interior da universidade.
A UnB, como qualquer outra universidade brasileira, não está acostumada com distâncias sócio-culturais e discussões sobre racismo, porque não tinha e não tem número significativo de negros em situação acadêmica homogênea. Há pouco tempo, antes das cotas principalmente, os negros da universidade estavam em sua maioria nos quadros funcionais, não nos de comando administrativo e científico, mas na faxina, no restaurante, no cuidado com os jardins. E a burocracia dos departamentos parecia o degrau maior que um negro alcançaria na hierarquia institucional.
Quando as cotas foram apresentadas e aplicadas ao dia a dia institucional, houve uma crescente e silenciosa manifestação, que não podemos chamar de racista a priori, de pais e alunos principalmente, que se sentiram injustiçados pelo sistema. Com o discurso da competência atacaram as cotas sob a acusação de levar alunos menos preparados para a universidade, leia-se negros e pobres, porque alunos da rede pública de educação. Esse e outros discursos tomaram forma e força, mas até agora não foram levados em consideração, porque discutir o racismo embutido na mente da classe média e alta brasiliense, me parece, pode ser algo perigoso para a universidade. Mas talvez tenha gradativamente despertado nossos monstros interiores, tenha acordado o racismo real, não o disfarçado na conversa de diversidade e democracia racial, mas o real, o violento, o discriminatório e segregacionista.
Brasília, sabemos, é recortada por áreas, onde o Plano Piloto branco e privilegiado separa geograficamente a periferia, diferente de várias outras cidades em que o encontro das diferenças é fato e cotidiano, aqui não percebemos o pobre e o negro, os isolamos a alguns seguros quilômetros do nosso centro “limpo”, da nossa convivência. Mas a UnB promoveu a aproximação de uma pequena parcela da população negra brasiliense e também trouxe alunos africanos e negros para estudarem aqui, obrigando desta forma o estreitamento de uma relação que encontrava-se sob controle, obrigando a comunicação e intercâmbio culturais. No entanto, feriu alguns, abriu chagas escondidas em falsas cicatrizes históricas que não percebidas em seus tempos repercutem em nossa realidade. Cá estamos com um ato de violência sem precedentes na universidade contra um grupo específico, despreparados para explicar convincentemente àqueles que sofreram a agressão o porquê de tamanho ódio contra eles, afinal, os convidamos à nossa convivência. Despreparados para explicar à nossa própria comunidade universitária, ou à nossa cidade. Curiosos por entender as motivações pessoais que levaram a uma ou mais pessoas a atacarem com fogo a casa de outras, com o risco ou vontade de causar sofrimento físico e psicológico. E medo, muito medo, de que essas pessoas sejam representantes de um pensamento encolhido e prestes a se libertar, representantes de uma intolerância e ignorância que deveríamos combater sempre e que muitas vezes esquecemos porque mais conveniente, porque talvez queiramos manter.


quinta-feira, 29 de março de 2007

Menina de Atins

Tenho carinho especial por essa foto. Tive a oportunidade de conhecer Atins, pequena vila de pescadores que se encontra nos Lençóis Maranhenses. Há um passeio obrigatório pelos pequenos lençóis que termina na casa da Dona Luzia, terminado o almoço preparado por ela, tomei meu café e passei a arrumar o equipamento fotográfico que sofre um pouco com a areia das dunas. Quando dei por mim, essa garotinha estava com esse olhar, não saía da posse. Muito devagar preparei a câmera, mirando em outro lugar da varanda com luz parecida, e virei para ela e fotografei. Ela fez que não notou e continuou mais algum tempo me olhando, nunca entendi porque, mas me fez bem, me senti o exótico, eu era o estrangeiro, afinal, podia ser apenas curiosidade de criança, mas que fez bem, fez.
Durante um tempo eu chamei essa foto de O Olhar, mas me parecia pretencioso demais, fica qualquer nome, Menina de Atins é bom também. Para mim interessa que ela me deu um grande presente, esse instante que pude congelar e guardar como memória daquele dia.
Continuo escrevendo sobre fotos, é um jeito de mostrá-las também, vai ser assim até eu acostumar com a idéia de ter esse espaço e ter algo para contar... Inté.

quarta-feira, 28 de março de 2007

Começamos assim...


Como a idéia não é apenas dar vazão aos pensamentos em forma escrita, e como tenho por interesse pessoal fotografar, principalmente temas antropológicos, um dia tirei essa foto da mão de um mestre de viola-de-cocho, não recordo seu nome. Peço perdão ao mestre, primeiro erro da primeira publicação, vá lá! Lembrarei...
Fica a minha homenagem à música e à fotografia. Dois assuntos que serão recorrentes nessas futuras linhas, entre outros, claro.