Na madrugada desta quarta-feira foram incendiadas quatro portas de quartos da Casa do Estudante da UnB. Após relatados à Reitoria da universidade os problemas relativos à xenofobia e racismo anônimos ocorridos nos prédios residenciais dos estudantes nada ainda havia sido feito. Pichações com motivos racistas e xenófobos foram ostensivamente escritos em portas e paredes do dormitório. Apesar dos protestos dos alunos o silêncio sobre o assunto foi a política da universidade. Alunos africanos são convidados entre nós para participarem de programas de ensino, tanto na graduação como na pós, no entanto, a democracia racial defendida pela reitoria como parte da história da universidade, que sempre lutou pelos direitos sociais, não parece ser a verdade. A justificativa de que a universidade foi pioneira na discussão e implantação das cotas para negros também não parece redimi-la da culpa de, como em qualquer ambiente desse país, o racismo ser uma pauta pouco discutida e uma prática constante. Houve, todavia, uma oposição de discursos não levada em consideração e deixada em aberto, as opiniões contrárias à implantação das cotas eram, em grande medida, discursos do racismo às inversas, e reclamava-se energeticamente da existência de pólos raciais no Brasil, gerando antipatia contra aqueles que buscavam dar visibilidade ao fato social brasileiro da existência de racismo entre nós, e da necessidade de buscar soluções rápidas para a educação formal de grupos de cor nos quadros universitários, tendo em vista formas culturais e lugares de atuação distintos desses novos alunos, o que traria novos desafios intelectuais e de convivência para o interior da universidade.
A UnB, como qualquer outra universidade brasileira, não está acostumada com distâncias sócio-culturais e discussões sobre racismo, porque não tinha e não tem número significativo de negros em situação acadêmica homogênea. Há pouco tempo, antes das cotas principalmente, os negros da universidade estavam em sua maioria nos quadros funcionais, não nos de comando administrativo e científico, mas na faxina, no restaurante, no cuidado com os jardins. E a burocracia dos departamentos parecia o degrau maior que um negro alcançaria na hierarquia institucional.
Quando as cotas foram apresentadas e aplicadas ao dia a dia institucional, houve uma crescente e silenciosa manifestação, que não podemos chamar de racista a priori, de pais e alunos principalmente, que se sentiram injustiçados pelo sistema. Com o discurso da competência atacaram as cotas sob a acusação de levar alunos menos preparados para a universidade, leia-se negros e pobres, porque alunos da rede pública de educação. Esse e outros discursos tomaram forma e força, mas até agora não foram levados em consideração, porque discutir o racismo embutido na mente da classe média e alta brasiliense, me parece, pode ser algo perigoso para a universidade. Mas talvez tenha gradativamente despertado nossos monstros interiores, tenha acordado o racismo real, não o disfarçado na conversa de diversidade e democracia racial, mas o real, o violento, o discriminatório e segregacionista.
Brasília, sabemos, é recortada por áreas, onde o Plano Piloto branco e privilegiado separa geograficamente a periferia, diferente de várias outras cidades em que o encontro das diferenças é fato e cotidiano, aqui não percebemos o pobre e o negro, os isolamos a alguns seguros quilômetros do nosso centro “limpo”, da nossa convivência. Mas a UnB promoveu a aproximação de uma pequena parcela da população negra brasiliense e também trouxe alunos africanos e negros para estudarem aqui, obrigando desta forma o estreitamento de uma relação que encontrava-se sob controle, obrigando a comunicação e intercâmbio culturais. No entanto, feriu alguns, abriu chagas escondidas em falsas cicatrizes históricas que não percebidas em seus tempos repercutem em nossa realidade. Cá estamos com um ato de violência sem precedentes na universidade contra um grupo específico, despreparados para explicar convincentemente àqueles que sofreram a agressão o porquê de tamanho ódio contra eles, afinal, os convidamos à nossa convivência. Despreparados para explicar à nossa própria comunidade universitária, ou à nossa cidade. Curiosos por entender as motivações pessoais que levaram a uma ou mais pessoas a atacarem com fogo a casa de outras, com o risco ou vontade de causar sofrimento físico e psicológico. E medo, muito medo, de que essas pessoas sejam representantes de um pensamento encolhido e prestes a se libertar, representantes de uma intolerância e ignorância que deveríamos combater sempre e que muitas vezes esquecemos porque mais conveniente, porque talvez queiramos manter.
A UnB, como qualquer outra universidade brasileira, não está acostumada com distâncias sócio-culturais e discussões sobre racismo, porque não tinha e não tem número significativo de negros em situação acadêmica homogênea. Há pouco tempo, antes das cotas principalmente, os negros da universidade estavam em sua maioria nos quadros funcionais, não nos de comando administrativo e científico, mas na faxina, no restaurante, no cuidado com os jardins. E a burocracia dos departamentos parecia o degrau maior que um negro alcançaria na hierarquia institucional.
Quando as cotas foram apresentadas e aplicadas ao dia a dia institucional, houve uma crescente e silenciosa manifestação, que não podemos chamar de racista a priori, de pais e alunos principalmente, que se sentiram injustiçados pelo sistema. Com o discurso da competência atacaram as cotas sob a acusação de levar alunos menos preparados para a universidade, leia-se negros e pobres, porque alunos da rede pública de educação. Esse e outros discursos tomaram forma e força, mas até agora não foram levados em consideração, porque discutir o racismo embutido na mente da classe média e alta brasiliense, me parece, pode ser algo perigoso para a universidade. Mas talvez tenha gradativamente despertado nossos monstros interiores, tenha acordado o racismo real, não o disfarçado na conversa de diversidade e democracia racial, mas o real, o violento, o discriminatório e segregacionista.
Brasília, sabemos, é recortada por áreas, onde o Plano Piloto branco e privilegiado separa geograficamente a periferia, diferente de várias outras cidades em que o encontro das diferenças é fato e cotidiano, aqui não percebemos o pobre e o negro, os isolamos a alguns seguros quilômetros do nosso centro “limpo”, da nossa convivência. Mas a UnB promoveu a aproximação de uma pequena parcela da população negra brasiliense e também trouxe alunos africanos e negros para estudarem aqui, obrigando desta forma o estreitamento de uma relação que encontrava-se sob controle, obrigando a comunicação e intercâmbio culturais. No entanto, feriu alguns, abriu chagas escondidas em falsas cicatrizes históricas que não percebidas em seus tempos repercutem em nossa realidade. Cá estamos com um ato de violência sem precedentes na universidade contra um grupo específico, despreparados para explicar convincentemente àqueles que sofreram a agressão o porquê de tamanho ódio contra eles, afinal, os convidamos à nossa convivência. Despreparados para explicar à nossa própria comunidade universitária, ou à nossa cidade. Curiosos por entender as motivações pessoais que levaram a uma ou mais pessoas a atacarem com fogo a casa de outras, com o risco ou vontade de causar sofrimento físico e psicológico. E medo, muito medo, de que essas pessoas sejam representantes de um pensamento encolhido e prestes a se libertar, representantes de uma intolerância e ignorância que deveríamos combater sempre e que muitas vezes esquecemos porque mais conveniente, porque talvez queiramos manter.
4 comentários:
Há também um outro problema: A solidariedade não vem. Um incidente como este deveria ser cercado de manifestações de solidariedade, de carinho e envolvendo muitas pessoas. Mas existe um conformismo doentio na sociedade brasileira. Entender as razões deste conformismo para entender o silêncio da Universidade desconfio ser tarefa necessária. Renato, bom o blog. Ótimas as fotos. E acho que todos nós que escrevemos em blogs queremos que nossas linhas repercutam, tenham leitores, tenham ressonância. Torço por você. Torço por nós. Abraço.
Pois é Renatão. Fiquei pasmado quando recebi um link do Youtube feito por um pessoal da UnB a respeito do assunto. Nunca fui tolo de achar que a intolerância racial fosse um problema solucionado, mas jamais imaginei que dentro da universidade, nas residências estudantis, isto aconteceria. Você tem razão: temos que ter muito medo mas temos que reagir! Parabéns pelo seu novo espaço! Fico orgulhoso meu irmão! Grande abraço.
Hoje haverá a primeira reunião na UNB do Programa Institucional de Combate ao Racismo.
É triste saber que mais uma vez é preciso que aconteça quase uma tragédia para que atitudes sejam tomadas, mas tomara que esse episódio sirva para alguma coisa boa.
Abração.
Renato, tratarei com a mesma intimidades que vejo pessoas escrevendo para você. Fotos, música, olhares, emoções...DENÚNCIA. INDIGNAÇÃO. que bom você faz parte daquele que são capazes de sentir e agir...
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